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De volta às origens

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sexta-feira, 9 de março de 2012

A viagem dos explorados

Um leve sotaque abaianado invade o ônibus. São operários da construção civil, ou peões como são conhecidos e eles mesmos gostam de ser chamados. Nervosos, se queixam: falam rápido e ao mesmo tempo. Todos. Até que um deles, ao meu lado, já emenda a pergunta de "quanto tempo a gente leva daqui a Belo Horizonte" com a explicação de tanta irritação.

A empreiteira que os contratara e os trouxera do Norte de Minas para a cidade onde embarcamos não cumpriu o combinado. Voltavam de mala e cuia e indignados. Pra piorar - conforme narrou um deles que sentou ao meu lado - a tal empreiteira os fizera esperar até às 15 horas para pagar o salário correspondente. Para quem não sabe, agências bancárias no interior fecham às 15 horas. E era uma sexta-feira. Ou seja, dinheiro somente na segunda-feira.

Mas como eles são brasileiros e nunca desistem conseguiram trocar os cheques no comércio local. Assim, exibiam bonés, bermudas e chinelos novos comprados como motivo de barganha com os comerciantes para trocar os cheques.

A viagem transcorreu tranquila com os olhos curiosos voltados para fora da janela. Observaram o movimento infinito de carretas, ônibus na rodovia federal. Entusiasmaram-se em ver fábricas, refinarias de petróleo e três cidades que de tão ligadas umas nas outras nem dá para perceber quando é uma, quando já é outra.

Não devem ter levado boas recordações da "capital de todos os mineiros"

Voltaram à terra natal já com um nome engatilhado de um advogado que vai os ajudar a processar a empreiteira na Justiça do Trabalho. Não sei se foi o barulho da estrada ou o sotaque carregado, mas não consegui entender a expressão que usaram. Algo equivalente a "mandar para o pau" que usamos ao entrar contra empresas na Justiça.

Como desembarquei antes do barulhento grupo, apenas despedi desejando boa sorte e que não se esquecessem de procurar o tal advogado em busca de seus direitos.

Nem eu nem o nobre leitor vamos ficar sabendo o final da história. Ela já se banalizou tanto e ainda persiste neste Brasil que jura ser emergente. Mesmo em meio a tantos avanços, modernidades e progresso o capital segue subjugando o trabalho.

PS> Os nomes da empreiteira e das cidades foram propositalmente omitidos. Não importa. A história narrada ocorre - e infelizmente deverá continuar - em muitas cidades e em muitas das empreiteiras.

Um comentário:

deca disse...

Infelizmente,é verdade. O capital vai continuar nos subjugando. O máximo que vamos conseguir, no médio prazo - uns 200 anos - é a humanização do capital. A relação ideal? Nunca.Sempre haverá um pai-patrão. Se ele não capitalista, será capitalista de estado. É o que eu penso.